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Nossas Histórias

ESSE BLOG É PARA CONTARMOS AS NOSSAS HISTÓRIAS, MOSTRAR A NOSSA LUTA E A NOSSA VITÓRIA...

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

Depoimento da Bela


Bia
Não lembro exatamente quantos anos tinha (7 ou 8 anos).
Morávamos numa ladeira e do meu muro conseguia ver toda a casa do vizinho.
Um dia o vi violentando uma de suas netas. Fiquei desesperada.
Gritei para ele parar e minha mãe e esposa dele viram tudo.
Ele era pastor de uma igreja grande e tinha uma situação financeira muito boa, além de ser muito bem visto no bairro.
Não sei se ele ameaçou minha mãe. Só sei que a partir daquele momento fui decretada LOUCA.
Fazia terapia com um psicólogo comprado e ia ao psiquiatra.
Acabei achando que era maluca mesmo (já que todos achavam) e passei a ter um comportamento arredio e agressivo.
Tinha uma fixação em olhar para a casa desse vizinho e presenciei ele violentar TODAS AS NETAS seguidas vezes.
Nessas ocasiões, ele me chamava e fazia gestos obscenos e me mostrava a genitália. Se masturbava e eu ficava ali. Imóvel e muda.
Passei a vida achando que aquilo era fruto da minha loucura.
Graças aos céus, quando fui para o ensino médio, nos mudamos. O tratamento parou, mas o estrago já estava feito.
Passei mais de 20 anos sem voltar àquele lugar ou ver aquelas pessoas.
Quando tive coragem, procurei um psiquiatra e uma psicóloga para me tratar de verdade, mas ainda pairava a dúvida na minha cabeça, por mais que me tratasse.
Há cinco anos, durante o sepultamento de uma amiga de infância, reencontrei essas meninas. No meio de uma conversa informal, uma delas tocou no assunto e contaram todo o martírio sofrido por elas.
Esse cara teve 6 filhos (5 meninos e 1 menina). Essa filha que foi violentada, optou por ser lésbica, devido à repulsa que sente pelo sexo masculino.
Os 2 filhos mais jovens se mataram. O do meio morreu de overdose de drogas. Outro, desapareceu (sumiu da família) e o mais velho é o único que conseguiu constituir uma família.
TODAS as netas foram violentadas desde crianças e, assim como a filha, foram desvirginadas pelo avô.
O neto mais velho dele também se matou.
A esposa foi definhando até morrer. Não tinha nenhuma doença.
Esse cara destruiu a família dele e fez um estrago na minha vida.
Tive enormes dificuldades para namorar. Meu noivo, com quem eu já estava há 7 anos, me acusava de ser lésbica, por que eu não aceitava sequer avançar no namoro, e não podia sequer tocar no assunto sexo.
Tivemos uma crise, por causa disso e ficamos afastados por 3 meses. Nesse tempo, pedi para o meu melhor amigo transar comigo.
Precisava saber se, além de louca, eu tinha algum “problema” com minha sexualidade.
Não foi a transa ideal, mas me traquilizou.
Só consegui me realizar como mulher depois dos 30 anos. Após muito tratamento e muita ofensa do meu então marido e de alguns poucos namorados com quem tentei me relacionar.
Algumas pessoas, do bairro onde cresci e da escola onde estudei se surpreendem ao saber que sou “normal”, muito bem sucedida em minha carreira profissional e com o meu trabalho social.
Quando comecei a trabalhar como voluntária com população de rua, aos 18 anos, comecei a sair daquele “mundo da loucura”. Ali, eu não era a maluca CDF da escola, ou a maluca isolada de casa.
Era NORMAL. Aquele trabalho foi o começo de uma redenção.
Depois que conversei com as meninas e constatei que tudo que vi e vivi era VERDADE, decidi fazer algo em favor das mulheres que tinham sofrido abuso na infância. Não encontrei nenhuma instituição na qual pudesse ser voluntária e ninguém que quisesse ser  ajudado. São verdadeiramente FILHOS E FILHAS DO SILÊNCIO.
Procurei então ajudar crianças vítimas de abuso sexual, negligência, maus tratos e exploração sexual.
No começo não havia nada. Era um TABU. Minha família (que sempre creditou meu trabalho social à minha “doença mental”) achou que falar sobre isso, ir para a televisão, criar página no Orkut era o ápice da loucura.
Mas consegui vencer meus medos, superar a dor de ver e não poder falar, o sentimento de culpa pela omissão e principalmente uma doença mental inventada e sustentada por muitos anos e estou aqui.
Te agradeço, Bya, por me ajudar a colocar para fora toda essa dor. Hoje, consigo falar nisso com serenidade, apesar da dor.
A participação no Grupo Filhas do Silêncio me fortaleceu demais.
Creio ter feito as escolhas certas para me curar: FORTALECIMENTO ESPIRITUAL, TRATAMENTO ADEQUADO E PRINCIPALMENTE: FAZER ALGO PARA AJUDAR O PRÓXIMO!

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

História da Liv...


Minha História...

Vim adiando o dia de postar a minha história aqui, mas acho que
 já está mais que na hora. 
Só para esclarecer, minha história é muito mais do que isso!
Minha vida é maior do que isso, 
mas para ser objetiva, vou tentar me ater aos
 fatos que me levaram a criar esse blog.

Eu tive uma infância muito feliz, antes de tudo,
 até que em algum momento entre os meus 10 e 11 anos,
 meus pais se separaram. Minha mãe logo logo se envolveu
com um homem que vou chamar de R.
 Em alguns meses ele já morava na nossa casa,
e eu gostei da ideia, de verdade.
 Ele tinha uma filha (ainda tem), que eu vou chamar de T.
Lembro da primeira vez que
 ele me tocou como se fosse ontem. E depois da segunda, da terceira. 
Até que foram tantas que não consigo mais distinguir os dias.
Alguns mais marcantes, 
outros que eu simplesmente não lembro.
E não, não era com violencia pura e bruta. 
Era diferente disso. Nas primeiras vezes, eu paralisei, por completo.
 Sem voz,
 sem movimento algum. Tudo que eu lembro era que na minha mente
 ressoava "que que isso?????" Até que piorou, é claro.
Começou a doer fisicamente e eu lutava
 para que parasse, porém acabei percebendo que era inútil, e só piorava a situação.
 Então, eu aprendi a aguentar calada, porque assim terminava mais rápido
 e ele me deixava em paz por mais tempo. E nisso, o tempo passou,
 eu fui crescendo e
 odiando cada vez mais. Nesse tempo, minha irmã,
 I. nasceu, o que só complicou as coisas.
 Minha mãe, bom, vou dedicar o próximo parágrafo à ela.

A fase "ficar calada e esperar acabar" passou.
 Um ódio inexplicável cresceu dentro de mim.
 E olhando para trás agora, eu me pergunto como eu
 consegui conviver com isso por tanto tempo.
Numa terça feira de março do ano passado,
o único resto de dignidade que eu ainda possuía,
 foi tirado de mim. É nesses cinco anos conheci todos
os aspectos de uma vida sexual,
menos o sexo em si, até essa terça feira.
No dia seguinte no colégio, não era difícil notar que
havia algo de errado comigo, e minha melhor amiga de todos os tempos, P.,
 se importou o
suficiente para não deixar para lá.
Na quinta feira, num impulso que me surpreendeu,
 eu escrevi o que tinha acontecido num pedaço de papel, e entreguei para ela.
Bom isso desencadeou uma sequencia de eventos que terminou comigo, P.,
a mãe de P.,
 todas no trabalho da minha mãe para contar a ela o que tinha acontecido.

E agora aqui vem ele, o paragrafo que eu chamo de: Minha Mãe.
Durante esses cinco anos diversas foram as vezes que minha mãe
 quase flagrou os "acontecimentos". Ela não via simplesmente porque
não queria.
 Eu não confiava nela o suficiente para contar,
e na minha cabeça eu não tinha
saída alguma daquela situação. A minha opção era ficar ali onde eu estava.
Hoje, é claro, percebo que aquela era de longe a ultima opção.
Eu podia ter dito á minha
mãe antes, ao meu pai, á policia, sei lá, qualquer um!
 Mas não me culpo! Agi como uma
criança jogada naquela vida, que entrou na adolescência naquela vida
. Que não teve a
oportunidade do primeiro beijo. da primeira vez.
 Que tem uma mãe que preferiu se cegar
diante a verdade do que encará-la. Não me admira que eu não tenha
 confiado nela antes,
 dado ao que aconteceu depois. Naquele dia, no trabalho dela,
ela acreditou em mim.
Reagiu com eu acredito que qualquer mãe reagiria.
Chorou, xingou e tudo mais. As coisas se
sucederam de uma maneira na mente dela, que ainda não entendo.
 Aos poucos ela foi mudando
 e no final do mesmo dia, ela já dizia ser impossível o que eu estava dizendo.
 Que se fosse verdade,
eu teria a dito antes. Três dias depois, ela expulsará R. de casa,
 mas me culpava disso.
 Dizia ter tido que escolher entre a filha e o marido,
 mas que ela sempre escolheria a mim,
 não importa o quão errada eu estivesse. Não espero que ninguém entenda o tanto
que isso me magoou, mas acreditem em mim, machucou
 talvez o tanto quanto ele me machucou.
 Durante todo o ano de 2010 eles continuaram namorando,
 e eu continuei sendo a filha que
 impedia o amor da mãe, o amor da família e etc.
Até que chegou janeiro de 2011
 e tudo mudou, de novo.

T., a filha dele, num desabafo com a minha mãe,
 contou que R. havia a machucado também.
 E a partir daí uma outra série de eventos se desencadeou,
terminando com a minha mãe me
 perguntando: "Por que você não me disse a verdade?"
E eu engolindo o jorro de palavras
 que estava prestes a sair da minha boca.
 Não valia a pena, e não vale até hoje, começar
 essa discussão. Talvez seja covardia minha, talvez eu devesse
 confrontar todo o passado.
Ou talvez, eu devesse deixar adormecido um pouco.
Depois de algumas conversas e resoluções,
todas nós terminamos numa delegacia, fazendo o que
 deveria ter sido feito um ano atras
. O processo todo da justiça, eu deixo para próximos posts,
 porque tenho certeza de que é
 um assunto que muitos tem interesse, e deve ser relatado com mais detalhes.
Hoje,
eu espero ansiosamente por uma sentença
que parece que não vai sair nunca mais!
Milhões de prazos já se esgotaram, mas o Sr. Juiz,
ainda não se decidiu.

Bom, e essa é a "minha história".
Mas como eu disse, minha história é muiiiito mais do que isso.
 Envolve muitas alegrias também :)
Não posso deixar de falar que é sim bem difícil escrever isso na internet,
e imaginar o que uma
pessoa imparcial pensará. O que eu posso dizer, é que eu não me importo tanto.
Eu me orgulho de quem eu sou. Do que eu fiz. Do que eu conquistei apesar de tudo.
 Ainda tenho um milhão de problemas para resolver dentro de mim
 mas daremos tempo ao tempo.
Espero muito ter ajudado alguém, e senão, posso dizer que me ajudei.